Nevoeiro nos olhos.
Passos gravativos.
Mente pesada.
Não vinha aqui há muito tempo. E,
para ser completamente honesto, nem sei como cheguei aqui. Deixei-te levares-me
por entre estas ruelas que conheci um dia, roçando ombros com desconhecidos que
me cumprimentam sem emoção, como se me puxasses por este fio condutor que não
sabia ainda ter.
Entrei sem bater à porta.
O cheiro atingiu-me a face como
uma parede de betão argilosa. Estava em casa. Como se nunca tivesse estado
noutro lugar senão aquele. Enfrentei o corredor, passando a sala, à minha
direita, a cozinha, à minha esquerda, e a dor, em todo o lado.
Gravitei até o teu quarto.
Ouvi, ao longe, algo que me deu a
volta ao estômago – tinha sabor a “nunca mais vou sentir isto”. Engoli a seco o
quão custoso era cada passo e continuei. Nunca
quis sair daqui, penso. Mas saí. Saí e fugi sem olhar para trás.
Fugi a sete pés quando te vi a
dar um passo atrás. Pelo caminho, deixei cair tanto de ti, tanto de mim, que,
agora, vejo-me encurralado por estas paredes cobertas de memórias infantis,
cruas e tão felizes.
Acabo por acreditar que imaginei tudo
o que grafitámos por estas velhas paredes; que a sensação fantasma que me tira
ativamente o oxigénio dos pulmões, é fruto da imaginação de alguém que nunca
aprendeu a crescer porque se perdeu pelo caminho.
Fecho os olhos, tento respirar
fundo e regresso à realidade.
Nem sei como cheguei aqui, penso
novamente, mas agora de verdade. Voltei a fugir e perdi as coordenadas no
espaço-tempo, desorientado por todo o lado, embatendo em ti – sempre em ti.
O barulho ensurdecedor de vozes
abafadas e dos dedos velozes sobre teclados convidam uma miúda dor de cabeça,
girando em bola de neve pelas minhas têmporas. Regresso a uma realidade rotineira,
de dias vagos e pouco alegres, onde, na melhor das hipóteses, não sinto nada, e
meto mãos à obra.
Finjo normalidade. Finjo que nada
aconteceu. Finjo que tu não aconteceste.
E, todos os dias, finjo que não
falho.