Escreve, disseste-me.
Sobre
o quê,
perguntei-te.
Sobre
o que tu sabes, sobre o que conheces.
Penso
muito sobre essa conversa. Pelo meio de todas as coisas que não me lembro,
acusado de só recordar o que me convém, lembro-me sempre das tuas palavras
certeiras.
Eu
não sei nada,
afirmei.
Sabes, retorquiste, sabes
muito sobre não fazer nada de jeito. Sobre seres uma merda. Sobre seres
dependente de alguém que tem de te encaminhar na vida. Sobre seres controlado. Sobre não teres ninguém.
Pelo
silêncio que assentou entre a tua resposta e a minha, lembro-me de sentir o
gume daquela cruel verdade a dilacerar-me por dentro.
Queres
que escreva sobre ti, sobre nós,
respondi-te.
Se
quiseres.
Não
era como que uma sugestão – era uma ordem. Se um dia te falar disto, vais
afirmar que estavas a brincar. Como quando falas mal de mim e eu acredito.
Só
acreditas quando falo mal de ti, já viste? Quando falo bem de ti, é porque estou
a gozar contigo.
Pois,
sim. É mais fácil acreditar em algo que tens como verdade, dentro de ti. E é
mais fácil acreditar nas tuas ásperas palavras quando as restantes são tão
raras.
Pouco
tenho escrito sobre ti desde então. Até agora.
Mereço
melhor que isto, que tu, todavia, não quero mais nada, mais ninguém. Diz mais
sobre mim do que sobre ti, não?
Cada
vez que me partes, que arrancas mais um pedaço de mim, fico vazio. Mas, ao
mesmo tempo, de forma irreal, reconfortado por saber que ficaste com mais um
pedaço meu para ti; Que isso só pode significar que me queres para ti; E o quão
bom é sentir-me apreciado.
Mas
isso é doentio, não é? Isso não é gostar de alguém. Isso é exercer poder sobre
alguém. E eu continuo a deixar. Porque só assim te tenho. Só assim alguém me
tolera.
O
que eras tu sem mim?
Nada, afirmo. Derrotado.
E
tens escrito?
Não.
Nem
para isso tu serves…